RADIOLOGIA INDUSTRIAL:
O uso das radiações ionizantes nas indústrias constitui-se num fator fundamental para o desenvolvimento do controle de qualidade em diversos processos industriais.
Este método chama-se radiografia industrial com raios gama, conhecido por gamagrafia, e é amplamente empregado nas siderúrgicas, na indústria do petróleo, nas indústrias aeronáuticas e companhias aéreas.
Dentre as técnicas utilizadas, destaca-se o método de inspeção da integridade estrutural dos componentes, dispositivos e equipamentos através de ensaios não destrutivos utilizando fontes radioativas.
Na gamagrafia utilizam-se fontes radioativas, emissoras de radiação gama, conjuntamente com detectores com a propriedade de coletar imagens radiográficas de peças e tubulações a serem ensaiadas, com o objetivo de identificar a presença de falhas em soldas, estado de corrosão, bolhas, contrações internas, erosão entre outros.
As imagens são coletadas num filme radiográfico, que tem características semelhantes aos utilizados em radiologia médica. As fontes usuais na gamagrafia são: isótopos de Cobalto-60 e Irídio-192, com atividades até 3,7 TBq (100 Ci).
Segundo os dados da Comissão Nacional de Energia Nuclear – CNEN existem atualmente cerca de 900 empresas no país que utilizam fontes radioativas em seus procedimentos industriais.
No Brasil, a técnica de radiografia industrial digital ainda é pouco conhecida e utilizada em função da falta de descrição de procedimentos experimentais bem como do estabelecimento de requisitos para o controle de qualidade, e para falar melhor sobre este assunto convidamos o Físico e Professor Ricardo Andreucci para uma entrevista na revista do CRTR.
CRTR – Qual a diferença entre Radiologia, Radiografia e Gamagrafia Industrial?
Ricardo Andreucci – O termo radiologia é uma denominação geral para o uso das radiações ionizantes em processos industriais, a radiografia e a gamagrafia são exemplos desses processos. A radiografia é um processo industrial onde se faz uso de um aparelho gerador de radiação (Raios-X), ao contrário da gamagrafia que se faz uso das radiações gama emitidas por uma fonte radioativa, ou seja, um radioisótopo, principalmente o Irídio-192 e Cobalto-60
CRTR – O que é utilização de fontes como medidores nucleares? Onde é utilizada esta técnica? Quem opera estes equipamentos?
Ricardo Andreucci – Os medidores nucleares são equipamentos que incorporam uma fonte radioativa com meia vida longa, como Césio-137, Cobalto- 60, Promécio-147 e outras, com baixas atividades. Podem ser fixos e portáteis, destinados ao controle de processos industriais. Os medidores fixos podem ser utilizados como medidores de nível interno de tanques nas indústrias químicas, siderúrgicas ou para controle de espessura de papel ou chapas metálicas finas. Os medidores portáteis se destinam ao controle de densidade da matéria prima para produção de papel e outras aplicações. Os equipamentos medidores nucleares fixos em geral são operados automaticamente sem a necessidade de pessoal especializado, já os medidores portáteis são operados manualmente por pessoal capacitado pela própria empresa e com treinamento em radioproteção.
CRTR – O que é perfilagem de poços de petróleo? Onde é utilizada esta técnica? Quem opera estes equipamentos?
Ricardo Andreucci – A perfilagem de poços de petróleo consiste no estudo do perfil geofísico, geológico e de formação rochosa das paredes do poço de prospecção de petróleo. A perfilagem permite obter informações importantes podendo revelar a existência de óleo e gás suficientes para justificar a completação do poço. Dentre as técnicas, onde podemos destacar o perfil de raios gama que consiste em detectar e medir a radioatividade natural emitida pelas rochas. Esta radioatividade é emitida pelas argilas existentes no meio poroso. Fontes radioativas de nêutrons também podem ser usadas com o mesmo objetivo. Tais técnicas são aplicadas por empresas terceirizadas com pessoal próprio treinado. A figura do Supervisor de Proteção Radiológica (SPR) qualificado é um profissional importante nesses processos.
CRTR – O que é radiografia industrial como técnica de ensaio não destrutivo?
Ricardo Andreucci – A radiografia industrial é um método de ensaio não destrutivo que serve para verificar falhas internas em componentes metálicos que possam comprometer seu desempenho mecânico quando submetidos a pressão ou esforço. Tais componentes podem ser juntas soldadas ou produtos fundidos.
CRTR – O que é irradiação de alimentos? Onde é utilizada esta técnica? Quem opera estes equipamentos?
Ricardo Andreucci – A irradiação de alimentos é um tratamento que usa a radiação gama proveniente de uma fonte radioativa de Cobalto-60 aplicado a certos alimentos com objetivo de reduzir a contagem microbiana, aumento do tempo de prateleira e até esterilização. Este método é usado em especiarias, algumas frutas e outros. Atualmente no Brasil somente duas empresas operam esses equipamentos através de seu pessoal próprio treinado e capacitado.
CRTR – O que são traçadores radioativos? Onde é utilizada esta técnica? Quem opera estes equipamentos?
Ricardo Andreucci – Não tenho notícias de uso industrial de traçadores radioativos por empresas privadas.
CRTR – O que são irradiadores de grande porte? Onde são utilizados? Quem opera?
Ricardo Andreucci – Os irradiadores de grande porte são assim denominados por operarem fontes radioativas, em geral Cobalto-60, com grandes atividades da ordem de milhões de Curies. São utilizados no tratamento de alimentos por irradiação e esterilização de produtos cirúrgicos entre outros. Os irradiadores de grande porte são automatizados operados por pessoal treinado pela própria empresa responsável.
CRTR – A lei 7394/95 que regulamenta a profissão do técnico em radiologia define como área de atuação a radiologia industrial, porém as normas CNEN para qualificação de operador e RIA não exigem esta formação técnica em nível médio. As atuais exigências destes profissionais garantem uma prestação de serviço adequada e segura?
Ricardo Andreucci – Sim. A qualificação e certificação dos Operadores e RIA’s – Responsáveis por Instalação Aberta é administrada pela CNEN através da sua norma NN-6.04 “Funcionamento dos Serviços de Radiografia Industrial”. Este processo é direcionado para a proteção radiológica que é a principal preocupação da CNEN, e exige formação de ensino médio para RIA e no mínimo ensino fundamental para operadores, além do treinamento de 80 horas em radioproteção para os dois níveis. Tal requisito consiste num diferencial em relação à área médica onde o técnico egresso do curso de Técnico de Radiologia não necessita de qualquer certificação adicional em radioproteção para atuação profissional.
CRTR – Atualmente existe a formação superior em Tecnologia em Radiologia que de acordo com as normas da CNEN o profissional com esta formação pode exercer a função de Supervisor de Proteção Radiológica (SPR). Quais as atribuições do SPR?
Ricardo Andreucci – A formação do profissional em Tecnologia ou nível superior é uma condição necessária, mas não suficiente para a função de SPR, pois adicionalmente é requerida a sua certificação de acordo com a norma CNEN NN 3.03. As atribuições do SPR são definidas pela norma CNEN NN 6.04 item 5.1.1 no caso de Radiografia Industrial, para outras práticas, tais como medidores nucleares, aceleradores, suas atribuições estão formalmente estabelecidas na norma CNEM NN-3.01.
CRTR – Quais as matérias essenciais para uma boa formação do tecnólogo em Radiologia Industrial?
Ricardo Andreucci – Como disciplinas essenciais, além daquelas que já fazem parte da grade curricular do Tecnólogo, podemos citar como sugestão: tecnologia de fabricação, normas e códigos, radiografia industrial, organização industrial, desenho técnico, sistema da qualidade.
CRTR – Dentro da radiologia de salvaguardas estão incluídos os aparelhos de inspeção de bagagem em portos, aeroportos e presídios. De acordo com a norma 3.01/001 CNEN a maioria desses aparelhos estão isentos de controle?
Ricardo Andreucci – Os aparelhos destinados a inspeção de bagagem, presídios, caminhões e “containers” se diferenciam muito entre si, em relação ao tipo do aparelho e intensidade de radiação emitida. A exclusão, isenção e dispensa de requisitos de radioproteção se aplica a casos em que a CNEN como Autoridade Regulatória, vier a considerar excluídos do seu controle e assim cabe a ela esta decisão.
CRTR – Estes aparelhos não trazem nenhum tipo de problema à população? É necessário ou não uma formação específica para operação destes equipamentos?
Ricardo Andreucci – Não, pelo contrário. Esses equipamentos trazem solução e ajudam a população à medida que o maior controle é exercido sobre a criminalidade, tráfico de drogas. Uma formação mínima e treinamento específico são requisitos desejáveis para operação dos equipamentos.
CRTR – Os aparelhos necessitam de inspeção ou manutenção periódica? Se sim, qual o profissional responsável por esta função e qual sua formação?
Ricardo Andreucci – Em geral, os equipamentos para gamagrafia industrial necessitam de cuidados permanentes, principalmente nas partes das conexões mecânicas que se desgastam com o uso. Tais manutenções são realizadas em geral pelo SPR ou empresa por ele indicado. Outros equipamentos, tais como aparelhos geradores de radiação (Raios-X) e medidores nucleares, as manutenções são realizadas por pessoal especializado da assistência técnica representante dos aparelhos.
CRTR – Quais são os riscos e acidentes mais comuns?
Ricardo Andreucci – Os aparelhos para gamagrafia apresentam risco maior na operação comparativamente aos outros, devido à condição crítica dos locais onde são usados e transportados. Dentre as situações de emergência mais comuns podemos citar: mau funcionamento do cabo de comando, desconexão da fonte radioativa no interior do tubo guia e outros, quase sempre relacionados com a falta de manutenção ou negligência do técnico.
CRTR – Qual sua opinião em relação ao mercado de trabalho nesta área?
Ricardo Andreucci – O mercado de trabalho na área da radiologia industrial é menor que na área médica, em razão que somente alguns processos industriais especiais fazem uso das radiações ionizantes. No entanto, investimentos no setor petróleo e petroquímico tem sido uma constante e irreversível nos últimos anos, garantindo as encomendas às fabricas e consequentemente manutenção do mercado de trabalho existente. A área de radiografia industrial é a que emprega maior contingente de pessoal na área da radiologia industrial, mas é também onde é requerido maior qualificação. Para tanto, a ABENDE através do SNQC- Sistema Nacional de Qualificação e Certificação, vem qualificando e certificando profissionais nesta área com reconhecimento nacional, sendo obrigatório este certificado em empresas fornecedoras de componentes para indústria de petróleo.
Ricardo Andreucci
Graduado em Física pela Universidade Mackenzie em 1974, trabalhou como Técnico em Proteção Radiológica no antigo IEA-Instituto de Energia Atômica em São Paulo, hoje muito conhecido como Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN)
Em 1987, iniciou na FATEC - Faculdade de Tecnologia de São Paulo como professor das disciplinas relacionadas com qualidade, no qual permanece até o momento.
Atualmente é colaborador na parte de treinamento de técnicos da Associação Brasileira de Ensaios Não Destrutivos (ABENDE) dividindo o tempo com trabalhos de assessoria pela sua própria empresa ANDREUCCI Assessoria e Serviços Técnicos.
Matéria publicada pela revista CRTR-SP
Conselho Regional de Técnicos em Radiologia – 5ª REGIÃO – SP
CRTR-SP – 40ª edição – Dez. 08
Fonte: http://www.crtrsp.org.br/Arquivos_Texto/revistas2.pdf